Louca, incrédula e humilhada.
O ódio mortal toma conta do meu ser. Uma vontade louca de matá-lo, de arrancar o coração dele, de vê-lo despedaçado, urrando de dor e me pedindo perdão. Somente pensamentos fúnebres passam pela minha mente. Somente vontades horrendas e atrozes. Coisas desumanas.
Indignada, grito sem parar, puxo meus cabelos, choro e saio chutando tudo o que vejo pela frente. Uma dor que alucina, tirando minha razão.
Vertentes de lagrimas banham meu rosto e o desespero me deixa louca. Gritos, soluços, lágrimas, dor, é só isto.
Aos trinta e seis anos, casada pouco mais de dez, sem filhos, graduada em duas faculdades, apartamento próprio, carros e vida profissional bem valorizada, classe média alta, enfim, um padrão de vida que a maioria dos brasileiros sonham em ter.
Sou uma mulher de fino trato que fui agraciada pela natureza. Alta, corpo esguio e sinuoso, extrovertida, espontânea e comunicativa, afinal, levava uma vida cômoda, intensa e com um homem de quarenta anos, viril, espirituoso e inteligente. Nosso relacionamento era bastante promissor em todos os sentidos, delicioso de ser sentido.
Até que...Até aquele dia...Até o dia da ruína...Até o dia fatídico...Até hoje.
Sexta feira...Havíamos feito amor da meia noite até as três horas da madrugada. Um sexo ardente, de pegadas fortes e suor a nos banhar. Dormimos banhados em nosso êxtase, abraçados e sorridentes.
Na manhã de sábado, acordo ao meio dia e ele já havia saído. Tínhamos a liberdade para sair à hora que fosse, a confiança nos permitia certas regalias. As treze horas ele retornou com comida japonesa e mais tarde pegou seu notebook e foi adiantar alguns serviços. Ajeitei a casa, tomei banho e fui comprar algumas coisas no supermercado e aproveitar para dar uma circulada pelas lojas no shopping.
Voltei para o nosso apartamento e ele havia saído de novo. Fiz um lanche e fui assistir a um filme que havia alugado. Eram vinte e duas horas quando o celular tocou...Eram vinte e duas horas...Nunca esquecerei.
Uma voz dizendo que, se eu quisesse encontrar o meu marido com a minha melhor amiga, que, me dirigisse a tal motel. Perguntei quem estava falando, como resposta, escutei;
Alguém tão decepcionado como você. Você não merece o que este safado faz contigo e desligou. Tentei ver o numero, mas estava como confidencial.
Peguei o carro e saí como louca, sem saber o que pensar. Eu não conseguia acreditar, achei que era trote, pensei um monte de besteiras, mas não conseguia me desviar do caminho. Eu precisava ter certeza de que, aquilo não estava acontecendo.
Masss...Mas estava. Estava e eu vi com meus próprios olhos. Procurei me controlar e cheguei na portaria, mostrando duzentos reais a atendente, para que confirmasse se o meu marido estava realmente lá. Prometi não dar escândalo e ao mesmo tempo, que iria filmar de longe a traição, se ela realmente estivesse acontecendo. As lágrimas escorriam e a mulher que também era casada, atendeu ao meu pedido. Olhando a ordem de entrada, o nome dele estava lá, junto com da minha melhor amiga. Quarto alugado para quatro horas.
Saí correndo e entrei em meu carro e fiquei no aguardo. Telefonei a um advogado colega meu e ele procurou me acalmar e me orientar sobre a atitude que eu deveria tomar. Quinze minutos depois, ele e a esposa encostavam o carro atrás do meu. O apoio que me deram foi fundamental, para que eu não perdesse a compostura e fizesse besteiras.
Eles saíram do motel rindo e eu do meu lado chorando. Cruel realidade. Meu desespero era alucinante...A esposa do meu amigo advogado pegou a direção do carro e me levou para casa.
Eles queriam que eu fosse para a casa deles, insistiram, imploraram, mas, um pouco refeita e controlada, disse estar tudo bem e que eu saberia como lidar com a situação.
Entrei no apartamento e passei a filmagem para o computador. Enviei o vídeo para minha Mãe que morava a três mil quilômetros de distância, com os seguintes dizeres; Olhe Mãe, veja com seus próprios olhos e me diga se acredita.
Minutos depois ele chega assobiando e ainda tem a desfaçatez de beijar meus cabelos e me perguntar se estava tudo bem. Não agüentei, o ódio foi maior. Uma raiva insana, a vontade louca de ter um revolver e descarregar neste infeliz, que sorria como se nada houvesse acontecido.
Dei enter e o vídeo começou a ser exibido. Neste momento caiu a ficha, a casa havia caído e com ele a máscara de marido exemplar.
Ele pediu calma e disse que iria explicar, mas, explicar o que ??? A canalhice, a sem vergonhice ???
Ódio...Lágrimas...Dor alucinante...Indignação...Verdadeiro ódio.
Perdi a linha, me descontrolei e então veio a tona, a explosão dos sentimentos da alma fiel de mulher traída. Impropérios, obscenidades, palavrões que nunca havia dito, saiam um atrás do outro. Eu gritava com toda força do meu ser, eu queria matá-lo, jogá-lo pela janela, infligir a dor que eu estava sentindo. Queria torturá-lo, queria massacrá-lo, queria fazer algo para que ele sentisse na carne, o que havia feito comigo.
O coração exasperado, as lágrimas turvavam minha visão, o ódio tirava minha razão.
Ele correu a apanhar algumas roupas, ao mesmo tempo em que pedia calma e desculpa.
Ao ver a mala pronta e ele se preparando para ir embora, perdi completamente a sanidade e parti pra cima dele, ele não iria embora sem receber um pouco do que merecia. Comecei a unhá-lo, mordê-lo, dando socos e pontapés até a hora que levei um tapa fortíssimo na cara e caí em cima da cama. Lá fiquei aos prantos e ele se foi.
Agarrei-me ao travesseiro e chorei convulsivamente. Chorava, esperneava, gritava como louca, sem saber o que fazer, sem ter o que fazer a não ser, expurgar o meu desespero. Comecei a socar o travesseiro, a cama, chutar tudo que tinha direito, jogar as coisas na parede, quebrar o que via pela frente e novamente, rios de lagrimas desciam e agora não tinha mais forças para gritar. Chorei, chorei e chorei, até que tudo se apagou.
Acordei e a tarde já caia. Um gosto horrível na boca, o estomago a roncar e a terrível realidade a encarar. Levantei, fui ao banheiro, escovei os dentes e entrei no banho.
Comecei a me esfregar com força, tentando inutilmente me limpar daquele homem.
De pensar que ultrapassei a todos os meus limites para fazê-lo feliz. Entreguei-me sem barreiras, me transformei na mais reles vagabunda para servir aos seus caprichos. Tornei-me a vadia mais safada que eu poderia ser. Busquei conhecimento sobre tudo na arte do sexo, me dispondo a aceitar até mesmo, algumas praticas adotadas no sadomasoquismo, tudo para satisfazê-lo em sua totalidade. Tudo...Tudo...Tudo o que ele poderia pensar ou querer, eu me dispus a suprir, em prol de um marido feliz e realizado.
Cabelo enrolado na toalha, nua, me olho no grande espelho da porta. Corpo perfeito, sem uma estria, sem uma cicatriz, seios rígidos, bumbum arredondado e cintura sinuosa. Uma bela mulher. Uma mulher por demais cobiçada e cantada e mesmo com tudo isto, de nada serviu.
As lágrimas brotam e se misturam com as gotas que ainda permaneceram no meu corpo. Sento no chão do banheiro com as costas apoiadas na parede. Nova onda de raiva e frustração...O desespero para achar qualquer coisa que eu havia feito de errado, rebuscando na memória, o que eu poderia ter deixado de fazer, para que ele tomasse tal atitude.
Como dona de casa, minha Mãe havia me preparado com esmero e nosso apartamento era deliciosamente perfumado e arrumado...Sempre fui considerada ótima cozinheira, adorava receitas e cardápio diferenciado...Minha inteligência e cultura se destacavam, com graduação em duas faculdades, enquanto ele só tinha uma...Companheira sempre pronta para qualquer programa ou passeio que ele quisesse fazer... Como mulher, sempre me disse ter orgulho de estar com alguém tão bela e agradável, fora os comentários elogiosos que recebíamos. Como amante, neste ponto, por puro Amor, fui realmente a mais voluptuosa e servil mulher que eu poderia ser.
Uma revolta descomunal se faz presente. Não consigo achar nada, absolutamente nada, que desse a ele o direito ou a necessidade de fazer o que fez.
Levantei-me, coloquei um roupão e fui tentar comer alguma coisa. A cabeça doía, uma leve tontura...Tentei me alimentar e acabei só tomando um suco de laranja.
Liguei o som, mas as musicas me irritaram, liguei a tv e aconteceu a mesma coisa. Sentei-me no sofá e o mundo desabou novamente...Desespero, choro convulsivo e mais urros vindo do fundo da alma...Queria morrer, queria que abrisse um buraco para eu me jogar dentro. Esbravejava, esmurrava a guarda do sofá, rolei para o tapete e deitada chorando fiquei até esgotarem as lagrimas. Chorar era meu único alento.
Havia desligado o celular, o telefone e a campainha, não queria saber de nada, a não ser, tentar aliviar um pouco daquela dor, que me tirava a respiração. Várias vezes, escutei batidas na porta, mas não atendi.
Chorei, chorei, até, adormecer deitada naquele tapete, que, por tantas vezes serviu como aconchego em noites de amor.
Não sei quanto tempo se passou e acordei assustada com alguém me cutucando.
Era minha Mãe...Minha doce Mãe...Minha amada Mãe.
Pulei em seus braços...Abracei-a com toda a força do meu ser...Aquele abraço, aquele colo, aquele calor era o que eu mais precisava neste mundo, e ela estava ali.
Chorava e gritava Mamãe...Mamãe porqueeeeee ???? Porqueeee Mamãe ???
Não conseguia fazer mais nada a não ser chorar e perguntar porque.
Um abraço que só uma Mãe tem o poder de dar. Um abraço que diz tudo nas vozes do silêncio. Um abraço reconfortante que não existe outro igual. O abraço que eu precisava.
Chorava, abraçava, gritava, perguntava porqueeee e novamente chorava até que faltaram forças em minhas pernas e eu fui arreando e sentei-me no chão.
Minha Mãe ajoelhou-se e me abraçou novamente até que minhas lagrimas deixaram de escorrer. Dor pungente...Dor destruidora...Dor esmagadora.
Minha Mãe ajudou-me a levantar e me levou para a cozinha...Me fez tomar, um café forte, amargo e horrível...As únicas palavras que ela havia dito desde que chegou, foram, filha na hora que me sacudiu e tomaaaaa na hora do café, e do mais, ficou a me olhar, calada.
Então soltei de uma vez, tudo o que eu fiz, tudo o que aconteceu, atropelando palavras e pensamentos e a raiva me fazia esmurrar a mesa...Ela me ouvia e as lágrimas que escorriam dos seus olhos marcavam sua blusa branca...Ela era a única pessoa que sabia realmente o tamanho da dor que me rasgava por dentro.
Tudo havia acontecido no fim de semana e já era sexta feira e eu não havia conseguido ir trabalhar. Meu Pai e meus irmãos haviam ligado tentando me confortar, mas eram palavras vazias.
Minha sogra apareceu. Mulher integra, alguém a quem eu admirava e tinha um amor incondicional...Parecia que, ela que havia sido traída...Parecia que o mundo também havia desmoronado pra ela. Ao me abraçar, chorava como uma criança e me pedia perdão e perdão...Perdão minha filha, perdoe-me filha minha.
Como não poderia deixar de ser, três mulheres abraçadas, sofrendo por um único infortúnio, por uma atitude que não havia razão de ser.
Contei com total apoio da família do meu ex-marido. Apoio desmedido, cheio de atenções e atitudes nobres de todos eles.
Por incrível que pareça, mas os próprios Pais, não o aceitaram de volta. No dia da separação, ele pernoitou lá, com a condição de procurar uma moradia no dia seguinte, pois, alguém que tem a capacidade de jogar no lixo, um casamento honrado, tem capacidade para reparar o erro ou então, assumir a responsabilidade e bancar com as conseqüências.
Minha Mãe permaneceu comigo por mais três meses, até, ter a certeza de que eu havia conseguido digerir um pouco, do tudo o que eu teria que enfrentar dali para frente.
O pedido de divórcio já estava em andamento e o apartamento a venda. Eu queria uma casinha pequena e tranqüila. Meus sonhos haviam tomado outro rumo. Eu ia precisar de algum tempo, para reformular todo o meu viver.
Três anos se passaram. Tornei-me uma mulher mais seca e desconfiada. Fiquei mais seletiva e mais intransigente quanto aos assédios.
Minha casa mais parecia uma loja de eletrodomésticos, tinha de tudo o que poderia se imaginar, vídeo games, aparelhos de ginástica, uma gama enorme de coisas que faziam minha alegria e preenchia o meu viver.
O arrependimento e a burrice que ele havia feito, também modificou aquele homem.
Não tenho mais ódio dele, somente pena. Magro, maltratado, um resto daquele homem esbelto e atraente. Ele tentou uma reaproximação, mas, olhar para a cara dele me causava asco, nojo e acabei por desprezá-lo, além de mostrar o quanto ele agora era insignificante pra mim.
Vivo totalmente em paz, totalmente dona do meu nariz, apesar de estar sozinha, não sinto solidão. Deixei na gaveta o meu lado mulher, esperando pacientemente o meu príncipe encantado, se ele vier a aparecer.
Ocupo minha mente com diversões saudáveis, passeios prazerosos, viajando anualmente para visitar meus Pais e irmãos e vou levando a vida com uma certa alegria.
Continuo me tratando muito bem e na realidade, tem uma paquerinha. Um homem de 45 anos que sofreu o mesmo trauma que eu. Há um ano que, esporadicamente jantamos fora, que vamos dançar e matar os desejos da carne, tudo isto sem compromisso, sem cobranças, sem satisfações.
Hoje, com mais maturidade e discernimento sobre a vida, vejo que, o que ele fez comigo, não tinha como objetivo me machucar...Ele caiu em tentação e não teve personalidade marcante ou não quis resistir e errou. Milhões de pessoas são acometidas deste mesmo mal.
Existem pessoas complacentes, existem pessoas que aceitam, existem pessoas que gostam, existem pessoas que repudiam...Enfim, cada um é cada um e eu sou eu.
Uma coisa que me entristece, são aqueles seres que se deixam levar pelos sentimentos e não conseguem mais esquecer os traumas que os outros causam e acabam vivendo, uma vida sem sentido.
Não sou de aceitar e corroborar com certos erros. Formei minha personalidade e meus conceitos de certo e errado e não abro mão.
Sou feliz por ser quem sou, sou feliz por ser a guerreira que me tornei, sou feliz porque a vida oferece muitas oportunidades para aprender e nos fazer crescer, basta ter atitude e ir a luta.
Tudo na vida são escolhas...Eu fiz a minha...CMRS.
Relato de uma amiga, a quem muito aprecio. Uma guerreira incansável que 46 anos, junto ao seu novo esposo(antigo paquerinha), sem filhos, vivem uma vida de viagens e aventuras, bastante agradável e feliz.
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